domingo, 28 de fevereiro de 2016

Aos 92 anos, médico de Mogi ainda atende e descarta aposentadoria

Nobolo Mori diz atender a quarta geração de algumas famílias.
Outros médicos que já passaram dos 70 também não pensam em parar.


Aos 92 anos, médico Nobolo Mori, de Mogi das Cruzes, continua atendendo. (Foto: Jamile Santana/G1)

Aos 92 anos, o médico Nobolo Mori, de Mogi das Cruzes (SP), trabalha todos os dias, de manhã e à tarde, em um hospital particular da cidade. Enquanto a maioria das pessoas sonha com a aposentadoria, ele e alguns colegas não pensam em pendurar o estetoscópio.
Para Mori, já são 62 anos dedicados à medicina. Mesmo com o aumento do número de médicos na cidade, ele diz que pacientes não faltam. Especialmente, os mais antigos. “Tem famílias que estão na quarta geração e eu continuo fazendo o atendimento de todos.” Para o médico é preciso ser útil enquanto está vivo. “A medicina é uma maneira de ser útil. O médico dá a sua vida para salvar vidas.”
Médico Nobolo Mori, aos 92 anos, ainda trabalha todos os dias da semana (Foto: Jamile Santana/G1)Médico Nobolo Mori, aos 92 anos, ainda trabalha todos os dias da semana (Foto: Jamile Santana/G1)


















Desde que se formou em 1953 na Faculdade Nacional de Medicina do Rio de Janeiro, não parou mais. “Em 1954 comecei a trabalhar como médico em Mogi das Cruzes. Meu pai era lavrador e queria que eu fosse médico”, conta Mori.
Ele diz que ao chegar na cidade, onde os pais já moravam, foi trabalhar na Santa Casa. “Naquela época no hospital só tinha o Doutor Rosa, Milton Cruz, Nelson Cruz e Nelson Straube. A gente trabalhava dia e noite na Santa Casa. E tinha muito chamado até a casa de paciente. Eu ia muito no Cocuera atender as famílias japonesas porque sou descedente também e falo o idioma”, lembra.
O atendimento ao paciente naquela época fazia toda a diferença, destaca Nobolo Mori. Isso por causa da falta de exames tão avançados quanto hoje. “A gente  tinha que saber os nomes de remédios, os nomes das doenças, os sintomas e pedir exames de laboratório para poder diagnosticar melhor, como sangue, urina e fezes.” Nobolo Mori acompanhou a evolução da medicina em Mogi das Cruzes. Além de atender, ele idealizou e construiu um hospital na cidade que foi inaugurado em 1962. “Fiz o hospital porque tinham poucos e precisava de mais vagas. Aí decidi fazer o hospital. O desafio foi bom para mim e outros colegas que fundaram a unidade comigo.”
Péricles é diretor em um hospital e atende também em seu consultório (Foto: Bruno dos Santos/Arquivo pessoal)Péricles (à dir) é diretor em um hospital e atende
também em seu consultório (Foto: Bruno dos
Santos/Arquivo Pessoal)
Medicina para continuar vivo
Aos 74 anos, o médico Péricles Bauab já tem quase 45 anos dedicados à medicina e nem pensa em parar. “Na nossa profissão parar é suícidio. Eu diminui meu ritmo, mas há dois anos fui convidado para participar da diretoria de um hospital particular da cidade. Hoje alterno entre a diretoria técnica e a superintendência e ainda atendo no meu consultório.”  Bauab é de Sabino, interior de São Paulo, e formou-se em medicina em 1970 na Faculdade de Medicina da Santa Casa de São Paulo.
Mogi das Cruzes entrou em sua vida depois que recebeu o convite para fazer plantões na antiga Maternidade Mãe Pobre. Era um trabalho temporário, mas ele diz que gostou tanto da cidade que acabou deixando a capital.
Para o obstetra e ginecologista, na medicina de antigamente era fundamental saber tirar as informações do paciente já que não existiam exames tão complexos e precisos quanto os atuais. “Não tinha ultrassom e nem sonar para ouvir o coração do bebê. A gente usava um instrumento de madeira em forma de tubo para ouvir o coração. Antes o diferencial do médico era a experência clínica. Os exames atuais facilitaram bastante a vida do médico.”
Para quem começou na profissão sem esses recursos tão avançados, Bauab conta que a atualização foi e ainda é constante. “Sempre gostei de participar de cursos e foi preciso para entender o ultrassom e outros exames que foram temas que  a gente não tinha na faculdade.”
Com tanto tempo dedicado à profissão, o médico acumula pacientes de várias gerações. Bauab diz que a mãe traz a filha que muitas vezes nasceu sob seus cuidados. “Faço com muito amor. Minha clientela sabe que gosto da medicina e faço com carinho. Não me canso. Deus me livre de me aposentar. Se aposentar tenho que fazer outra coisa.”
Glauco de Lorenzi se dedica a medicina diariamente (Foto: Arquivo/O Diário)Glauco de Lorenzi se dedica a medicina diariamen-
te (Foto: Arquivo/O Diário)
Parto à luz de lampião
Criado em Mogi das Cruzes, Glauco de Lorenzi deixou a cidade para estudar medicina no Rio de Janeiro onde se formou em 1966. Depois retornou para a cidade onde se dedica aos seus pacientes há 50 anos. Ele se recorda do tempo em que atuava como médico na Santa Casa de Mogi das Cruzes, trabalhando no mínimo 16 horas por dia. A jornada ficava ainda maior com  os atendimentos feitos na casa dos pacientes. “Uma coisa que hoje não existe mais, mas que era muito comum quando comecei na medicina eram os chamados nas residências. Eu fiz vários partos em casa, especialmente no bairro do Cocuera. Em Mogi tinha muita parteira e quando elas não conseguiam fazer o parto chamavam o médico. Eu fiz parto à luz de lampião no Cocuera. Chegava na casa, a parteira estava pálida por conta das dificuldades com o parto e o marido nervoso.”
A medicina era mais humanizada, menos exame e mais carinho", Glauco de Lorenzi médico há 50 anos
Como não existiam exames avançados, pronto-socorros ou farmácias de plantão 24 horas, Lorenzi lembra que o médico tinha que estar preparado para emergências a qualquer hora. “Eu tinha uma mala pronta no meu fusca para fazer os atendimentos de última hora. Lá tinha de tudo: materiais de sutura, remédios, enfim tudo que eu pudesse precisar em um atendimento de urgência.”
Outra dificuldade de exercer a medicina antigamente era a falta de exames complementares, diz o médico. “Quando comecei Mogi tinha dois laboratórios e dois aparelhos de Raio X. Um ficava na Santa Casa e outro em um prédio comercial no Largo do Rosário. Era o que  a gente dispunha. Era preciso examinar e ouvir muito bem o paciente para poder fazer o diagnóstico.  Os remédios também não eram tão poderosos quanto hoje. Enfim não era fácil, era bastante difícil. Além disso tudo, todos os farmacêuticos da cidade faziam as vezes de médico. Antes de ir ao médico, o cidadão ia à farmácia e também à benzedeira. Quando não tinha jeito mesmo corria para o médico.”
Com o passar do tempo, o médico conta que os exames foram surgindo, como o ultrassom e tomografia e todos precisaram se atualizar para acompanhar os avanços. “Não me formei, eu ganhei um diploma. O médico não se forma nunca porque ele precisa estudar sempre. Tem coisa que a gente esquece e precisa rever. Hoje com a internet facilitou demais. Mesmo os mais idosos têm que lidar com a internet que é um recurso valioso de informação.”
Atualmente, o médico trabalha nove horas em média em seu consultório e também na Prefeitura. Especializado em cirurgia de cabeça, pescoço e geral, Lorenzi afirma que já virou médico de família, o famoso clínico geral.
Aos 74 anos, Lorenzi lembra com carinho dos tempos de dificuldade do início da carreira. “A medicina era mais humanizada, menos exame e mais carinho.”

domingo, 21 de fevereiro de 2016

Lampião em Lucrécia-RN

O DIA EM QUE “O CÃO DOS INFERNOS” PASSOU

Por: Rostand Medeiros


Atualmente é inegável e extremamente louvável o esforço da cidade de Mossoró para que a resistência do seu povo ao bando de Lampião em 1927 jamais seja esquecida.
Em uma das praças principais desta cidade encontramos um local de preservação da memória denominado Memorial da Resistência, que através de uma bela exposição temática se encontram belos e interessantes painéis, onde o visitante conhece o esforço que a comunidade realizou para resistir ao maior cangaceiro do Brasil.
O bando de Lampião em Limoeiro do Norte, Ceará, após a derrota em Mossoró.

Mas ao longo dos últimos anos o resgate e a manutenção da memória do ataque dos cangaceiros a Mossoró é tão intenso e forte, que ao se conversar com as pessoas da cidade, com a intenção de se conhecer mais destes fatos têm-se quase a impressão que Lampião e seus homens chegaram à cidade “voando”. A falta de informação sobre o que ocorreu antes ou depois do bando passar pela cidade é tamanha, que algum incauto pode ficar com a sensação que os cangaceiros “saltaram de paraquedas” na Avenida Alberto Maranhão, para depois combaterem e serem fragorosamente derrotados.
Exageros a parte, mesmo existindo no Memorial da Resistência várias informações sobre o que se passou ao longo do trajeto, percebe-se a desinformação.

Mas a culpa não é dos dirigentes e nem muito menos do povo de Mossoró. De forma alguma. Eles fazem a parte deles, que é lembrar o que os defensores da cidade.
Em 2009, em duas oportunidades, tive o privilégio de conhecer e percorrer todo o trajeto originalmente palmilhado pelos cangaceiros no Rio Grande do Norte. Infelizmente pude comprovar que em relação à memória destes fatos, a maioria dos municípios criados a partir do desmembramento dos seis territórios municipais originalmente percorridos por Lampião e seu bando, pouco ou nada fizeram em relação à preservação da memória dos acontecimentos de junho de 1927.

Algumas autoridades municipais nem sequer tem conhecimento que os cangaceiros passaram pela área dos seus municípios. Em outras cidades encontramos quem realmente gostaria de fazer alguma coisa para preservar a memória destes fatos, mas, ou não recebem apoio, ou nada mais resta para mostrar.
Entretanto existem maravilhosas exceções. Municípios onde abnegados secretários de cultura, ou de turismo, com praticamente quase nenhum recurso vindo dos cofres públicos e com muita criatividade, lutam para manter esta memória viva junto as suas comunidades. São poucos, mas são valorosos exemplos de dedicação à história, que realmente comovem aqueles que se interessam pelos acontecimentos do passado no Rio Grande do Norte.

Um dos municípios que mais me chamou a atenção pelos aspectos extremamente interessantes na preservação desta memória foi a pitoresca Lucrécia.

UMA INTERESSANTE ORIGEM NA SUA DENOMINAÇÃO

Antes que alguém possa imaginar que um pomposo dono de terras da região oeste potiguar decidiu colocar como denominação de sua fazenda o nome de “Lucrécia”, para assim honrar a memória da famosa Lucrécia Bórgia, uma rica italiana que viveu no século XV, que se dedicou a ser uma protetora das artes e que devido a suas relações com parentes sem escrúpulos não lhe faltaram inúmeras acusações de delitos e vícios. Pode esquecer, não é nada disso.
Vista atual da cidade de Lucrécia, a 360 km de Natal.

Segundo os moradores da cidade, a Lucrécia em questão era uma senhora negra, que havia sido escrava, que conseguiu sua libertação e era dona de uma gleba na região.
Ao redor do seu sítio foram edificadas as primeiras habitações, onde a vida seguia a passos lentos até a primeira metade da década de 1930. Neste período, nas terras do antigo sítio de Dona Lucrécia, o extinto IFOCS – Instituto Federal de Obras Contra as Secas decidiu represar o Rio Mineiro e o Riacho Pé de Serra, para assim desenvolver uma barragem de 27 milhões de metros cúbicos de água. Verdadeiro fator de desenvolvimento nesta região tão árida, no auge da obra um contingente de 2.500 trabalhadores se dedicaram a construção da barragem e a comunidade foi se desenvolvendo.

Luís da Câmara Cascudo conta no livro Nomes da Terra (1968), nas páginas 204 e 205, que esteve na região em 1934, que a vila possuía energia elétrica, além de “duzentas casas de tijolo e telha e dois mil moradores, lojas e armazéns”.
Igreja Matriz de São Francisco de Assis, no centro de Lucrécia.

Segundo o amigo Rivanildo Alexandrino da Silva, atual Secretário de Cultura da Prefeitura Municipal da vizinha cidade de Frutuoso Gomes, informa que o grande açude foi inaugurado em 1933, mas só veio a sangrar em 1955 e que as más condições dos alojamentos, além da falta de saneamento no acampamento dos trabalhadores, acarretou em um forte surto de cólera.
A emancipação política só ocorreu no dia 27 de dezembro de 1963, através da Lei 3.040, quando Lucrécia se desmembrou da cidade de Martins.

Não sei se cabe e se é verdade, mas o comentário na região é que esta cidade seria a única no Brasil onde a sua denominação tem origem a partir de uma mulher negra e que foi escrava.
Mesmo com a história local sendo pontuados de acontecimentos interessantes, para o povo de Lucrécia à passagem de Lampião pela região figura entre um dos momentos mais significativos do município.

O DIA EM QUE “O CÃO DOS INFERNOS” PASSOU

Quem segue pela rodovia estadual RN-117, a partir da cidade de Olho D’água dos Borges em direção a Umarizal, vai encontrar em um determinado ponto a esquerda um entroncamento onde tem início a RN-072. Estrada com pouco ou quase nenhum acostamento e algumas curvas sinuosas, mas que chama a atenção de quem segue por este caminho pela interessante visão dos contrafortes da grande Serra de Martins.
Distante cerca de 360 quilômetros de Natal, a cidade de Lucrécia continua calma e a vida segue tranquila e devagar para seus mais de 3.600 habitantes.
Mas em 1927 a coisa foi bem diferente.

No dia 11 de junho daquele ano algumas pessoas que seguiam do povoado de Boa Esperança, davam conta aos proprietários rurais que um grande bando de cangaceiros, comandados pelo terrível Lampião, estava vindo pela estrada. As informações eram desencontradas e imprecisas, mas não era necessário muito entendimento para saber que o melhor era sair do caminho desta gente e todos diziam que “Lampião vem aí”.
Ao anoitecer daquele sábado, alguns assombrados retirantes informavam que o bando havia atacado Boa Esperança, provocando muitas desgraças e atingindo várias pessoas. Após deixarem a pequena vila, a turba de saqueadores encourados atacou a propriedade denominada Mombaça, do fazendeiro Frutuoso Gomes.

Através de informações do amigo Rivanildo Alexandrino, no período do ataque havia no lugar no máximo quinze residências. O bando de Lampião invade primeiramente a casa de José Gomes. Na residência de Frutuoso eles interrompem uma novena e em um inusitado gesto de boa vontade, procuram distribuir cortes de fazenda a população local, que foram roubados em Boa Esperança. Mesmo assim ocorreram espancamentos e saques.
Aspecto atual da sede da propriedade Cacimba de Vaca, atacada por Lampião e seus homens, encontrava-se vazia e foi depredada.

Seguem depois para outras propriedades, mas Lampião tem a informação que o melhor está cerca de meia légua para frente e é uma fazenda denominada Cacimba de Vaca. O seu proprietário, Joaquim Dias da Cunha, tido como homem de dinheiro, soube do avanço da tropa de sicários e não perdeu tempo. Pegou seu povo e suas riquezas e tratou de fugir. Esta fuga enraiveceu Lampião e o bando descontou a desdita numa extensa lista de depredações, um incêndio criminoso ao paiol de cereais e de utensílios rurais.

Na atualidade, em relação à residência de Joaquim Dias a mesma foi extensamente reformada, sendo completamente alterada, não deixando, mas nenhuma característica daquele período. Mas até a última reforma era possível, segundo seus atuais moradores, ver as marcas de balas na parte superior da edificação.
Em setembro de 2009 encontramos ainda altivo e extremamente animado e simpático, o agricultor aposentado Glicério Cruz. Vivendo em um antigo grupo escolar com sua família, Seu Glicério não se deixa abater pela precariedade de suas condições e dialoga animadamente sobre Lampião. Para ele, que tinha quatorze anos na época do ataque, Lampião vinha “como o cão dos infernos”, quebrando e destruindo tudo pela frente. Ele e sua família, ao primeiro alarme da presença do bando na região, trataram de se abrigar no alto da Serra de Martins.

NOVOS ATAQUES

Na atual zona urbana de Lucrécia, as margens da RN-072, encontramos uma antiga casa bem preservada e que em setembro de 2009 havia sido recentemente pintada de branco. É a antiga sede da Fazenda Castelo.
Na noite de 11 de junho os bandidos adentraram casas de moradores, simples choupanas, onde o agricultor Raimundo Alves de Oliveira foi ferido a bala e só não passou desta para melhor porque se fingiu de morto. Infelizmente Raimundo carregaria pelo resto da vida um aleijão no braço atingido, decorrente do disparo.
Atual estado da casa da Fazenda Castelo.

Sobre a invasão da residência mais importante da propriedade não existem maiores informações. Inclusive chegamos a suspeitar que esta casa houvesse sido construída após a passagem do bando. Entretanto, ao buscarmos contato com as pessoas mais idosas na cidade, estas informavam não terem dúvidas sobre a antiguidade do lugar e que a mesma pertencia na época a Elias Leite. Esta informação é corroborada na página 73, do livro “Relação dos Proprietários e dos Estabelecimentos Rurais Recenseados no Estado do Rio Grande do Norte em 1920”, que aponta o mesmo lugar como pertencente a Elias da Silva Leite.

Além de sua localização excepcional, o seu estado de conservação é ímpar, sendo considerado um marco histórico por ser uma das residências mais antigas e precursoras da povoação.
Assobradada, com muitos cômodos, a residência se apresenta atualmente sem moradores, mas seus atuais proprietários estão mantendo o local em bom estado de conservação e, segundo os moradores mais idosos com quem tivemos oportunidade de conversar, preservando a originalidade.

No terreno ao lado da sede da fazenda Castelo se encontra uma bem preservada capelinha dedicada a Nossa Senhora da Guia. Já em relação a este local não foi possível saber se a mesma foi construída como uma promessa por alguma graça alcançada diante dos sicários. Um último apontamento informa que o local foi utilizado para a fabricação de uma aguardente chamada “Castelo”.

O SOFRIMENTO DE EGIDIO E DONATILA LEITE
O casal Egídio Dias da Cunha e sua mulher Donatila Leite Dias. Sofrimento nas mãos dos cangaceiros.

Egídio Dias da Cunha, e sua mulher, Donatila Leite Dias eram os proprietários do próximo alvo, a Fazenda Serrota, ou Serrota dos Leites. Egídio soube da presença do bando na região, mas desdenhou do fato. Passava das onze da noite quando sua mulher lhe alertou haver escutado alguns tiros em direção à fazenda Castelo. Novamente o fazendeiro não aproveitou os avisos e não saiu da sua propriedade.
Logo a desgraça, na forma de um bando de cangaceiros fedorentos, batia a sua porta. Para Lampião foi uma satisfação saber que acabava de encontrar um dos filhos de Joaquim Dias, da fazenda Cacimba de Vaca e que agora poderia arrancar algum dinheiro do abastardo genitor de Egídio. Seu resgate foi avaliado em dez contos de réis.
Comentários existentes na região afirmam que a violência dos bandidos foi intensa, principalmente contra Donatila Leite. Móveis foram quebrados, baús foram destruídos, seus conteúdos espalhados. Os homens buscaram na cozinha alimentos e um pote de água foi quebrado na sala. Tudo foi revirado, vários objetos roubados e alimentos foram levados.
Outras duas casas da Serrota, as dos moradores Chagas Manoel e Raimundo de Paula Cosme, foram igualmente invadidas, com surras e saques dos moradores.

UMA PRETENSA RESISTÊNCIA

Com a saída dos cangaceiros do sítio Serrota e a prisão de Egídio, a notícia se espalha entre vários parentes e amigos. Logo um grupo de moradores da região decide com extrema coragem, sair em busca daqueles que pudessem ajudar a levantar a quantia estipulada por Lampião no povoado de Gavião, atual cidade de Umarizal, para soltar o popular Egídio.
Estrada que, segundo os moradores da região, foi à mesma utilizada pelo bando para chegarem a região do Caboré.

O grupo era pequeno, com um número que aparentemente chega a quatorze e só quatro deles, Bartolomeu Dias, Francisco Canela, João “Bolacha” e Sebastião Trajano, eram os únicos que os pesquisadores do assunto apontam como possuindo rifles. O resto da tropa levava armas curtas, espingardas de soca e facões.

Este grupo conhecia os caminhos, provavelmente confiavam no fato de ser período de lua cheia e que isto facilitaria o trajeto. A frente destes homens seguia Emídio Dias, irmão do sequestrado.
Enquanto se desenrolava esta situação, na região do sítio Caboré, cansados pelo deslocamento, esgotados pelas ações e pelo alto consumo de cachaça, o bando decidiu descansar, próximo ao casebre de um cidadão conhecido como José Alavanca, que atualmente não existe mais.
Por volta das três da manhã o grupo comandado por Emídio Dias chegou a esta casa humilde em busca de informações. O que eles não sabiam era que um cangaceiro, facilitado pelo luar, vigiava os movimentos do grupo.

No local conhecido como “Serrote da Jurema” foi armada uma emboscada pelo bando de experientes combatentes. Logo abriram fogo contra a incipiente tropa. Como resultado Bartolomeu Dias, Francisco Canela e Sebastião Trajano tombaram e o resto fugiu em franca debandada. A vingança do bando de Lampião nos corpos dos amigos de Egídio foi terrível. No outro dia foram transportados em redes para Martins, feitos os exames cadavéricos e enterrados no cemitério local.
Aspecto de Lucrécia na década de 1940

Para melhor entendimento, segue os laudos cadavéricos dos três homens mortos, através de material fornecido pelo pesquisador da cidade de Martins, Junior Marcelino.

AUTO DE EXAME CADAVÉRICO 1
Aos doze dias do mês de junho de 1927, nesta cidade do Martins, na Intendência Municipal, às dezessete horas, presente o Delegado de Polícia Tenente Abílio Campos, comigo Antônio Inocêncio de Oliveira, Escrivão do seu cargo, abaixo nomeados os peritos Emídio Fernandes de Carvalho e José Ignácio de Carvalho Sobrinho, à falta de profissionais, e as testemunhas abaixo assinadas, todas residentes nesta cidade. Aquela autoridade tomou dos mesmos peritos o compromisso formal de bem e fielmente desempenharem a sua missão, declarando com verdade o que descobrirem e encontrarem e o que em suas convicções entenderem e encarregou-lhe que procedessem a exame no cadáver de Bartolomeu Costa Dias e que respondessem aos quesitos: 1º se houve morte; 2º qual o meio que a ocasionou; 3º se foi ocasionada por veneno, substância anestésica, incêndio, asfixia ou inundação; 4º se por sua natureza foi causa eficiente da morte; 5º se a constituição ou estado mórbido anterior do ofendido concorreu para tornar essa lesão irremediavelmente mortal; 6º se a morte resultou das condições personalíssimas do ofendido; 7º se a morte resultou não porque o mal fosse mortal e sim por ter o ofendido deixado de observar o regime médico reclamado pelo seu estado. Em consequência passaram os peritos a fazer os exames e investigações ordenadas e as que julgassem necessárias e concluídas as quais declararam: que examinando o cadáver de Bartolomeu Costa Dias, de vinte anos de idade, cor morena, e encontraram sete ferimentos, sendo dois deles na região palpebral direita e esquerda, dois nas regiões inferiores das pernas, todas produzidas por instrumento perfuro-contundente, dois ferimentos profundos nas regiões abdominais e hipocôndrio direito e outro nas regiões parietais direitos produzidos por projétil de arma de fogo em que responderam ao 1º quesito sim, houve morte; ao 2º por instrumento perfuro-cortante e projétil de arma de fogo; ao 3º negativamente; ao 4º, sim; ao quinto, sexto e sétimo ( 5º, 6º e 7º ) não. E são estas as declarações, que debaixo de compromisso prestado têm a fazer. E por nada mais haver, deu-se por concluído o exame, ordenado e de tudo se lavrou o presente auto que vai por mim escrito, assinado e rubricado pela autoridade, assinado pelos peritos e testemunhas, comigo Antônio Inocêncio de Oliveira, Escrivão, o assinei e assino.
Processo-crime contra Virgulino Ferreira e outros instaurado na Comarca de Martins/RN, 1927, fls. 09/11.
LAUDO DE EXAME CADAVÉRICO 2
Aos doze dias do mês de junho de 1927, nesta cidade do Martins, na Intendência Municipal, às dezessete horas, presente o Delegado de Polícia Tenente Abílio Campos, comigo Antônio Inocêncio de Oliveira, Escrivão do seu cargo, abaixo nomeados os peritos Emídio Fernandes de Carvalho e José Ignácio de Carvalho Sobrinho, à falta de profissionais, e as testemunhas abaixo assinadas, todas residentes nesta cidade. Aquela autoridade tomou dos mesmos peritos o compromisso formal de bem e fielmente desempenharem a sua missão, declarando com verdade o que descobrirem e encontrarem e o que em suas consciências entenderem e encarregou-lhe que procedessem a exame no cadáver no cadáver de Sebastião Trajano e que respondessem aos quesitos: 1º se houve morte; 2º qual o meio que a ocasionou; 3º se foi ocasionada por veneno, substância anestésica, incêndio, asfixia ou inundação; 4º se por sua natureza foi causa eficiente da morte; 5º se a constituição ou estado mórbido anterior do ofendido concorreu para tornar essa lesão irremediavelmente mortal; 6º se a morte resultou das condições personalíssimas do ofendido; 7º se a morte resultou não porque o mal fosse mortal e sim por ter o ofendido deixado de observar o regime médico reclamado pelo seu estado. Em conseqüência passaram os peritos a fazer os exames e investigações ordenadas e as que julgassem necessárias e concluídas as quais declararam: que examinando o cadáver de Sebastião Trajano, de trinta anos de idade, de cor morena, encontramos um ferimento na região torácica interna (lado esquerdo) atingindo o coração, produzido por projétil de arma de fogo, e que, portanto, responderam ao 1º quesito sim, houve morte; ao 2º arma de fogo; ao 3º negativamente; ao 4º, sim; ao 5º, 6º e 7º, não. E são estas as declarações, que debaixo de compromisso prestado têm a fazer. E por nada mais haver, deu-se por concluído o exame, ordenado e de tudo se lavrou o presente auto que vai por mim escrito, assinado e rubricado pela autoridade, assinado pelos peritos e testemunhas, comigo Antônio Inocêncio de Oliveira, Escrivão, o assinei e assino.

Processo-crime contra Virgulino Ferreira e outros instaurado na Comarca de Martins/RN, 1927, fls. 11/13.

LAUDO DE EXAME CADAVÉRICO 3
Aos doze dias do mês de junho de 1927, nesta cidade do Martins, na Intendência Municipal, às dezessete horas, presente o Delegado de Polícia Tenente Abílio Campos, comigo Antônio Inocêncio de Oliveira, Escrivão do seu cargo, abaixo nomeados os peritos Emídio Fernandes de Carvalho e José Ignácio de Carvalho Sobrinho, à falta de profissionais, e as testemunhas abaixo assinadas, todas residentes nesta cidade. Aquela autoridade tomou dos mesmos peritos o compromisso formal de bem e fielmente desempenharem a sua missão, declarando com verdade o que descobrirem e encontrarem e o que em suas consciências entenderem e encarregou-lhe que procedessem a exame no cadáver no cadáver de Francisco Canela e que respondessem aos quesitos: 1º se houve morte; 2º qual o meio que a ocasionou; 3º se foi ocasionada por veneno, substância anestésica, incêndio, asfixia ou inundação; 4º se por sua natureza foi causa eficiente da morte; 5º se a constituição ou estado mórbido anterior do ofendido concorreu para tornar essa lesão irremediavelmente mortal; 6º se a morte resultou das condições personalíssimas do ofendido; 7º se a morte resultou não porque o mal fosse mortal e sim por ter o ofendido deixado de observar o regime médico reclamado pelo seu estado.
Em consequência passaram os peritos a fazer os exames e investigações ordenadas e as que julgassem necessárias e concluídas as quais declararam: que examinando o cadáver de Francisco Canela, de quarenta anos de idade, cor morena, encontraram três ferimentos, sendo um na região nasal produzido por faca de ponta, dois na região torácica lateral direita e esquerda, produzidas por um projétil de arma de fogo, e que, portanto, responderam ao 1º quesito sim, houve morte; ao 2º por instrumento perfuro-cortante e projétil de arma de fogo; ao 3º negativamente; ao 4º, sim; ao 5º, 6º e 7º, não. E são estas as declarações, que debaixo de compromisso prestado têm a fazer. E por nada mais haver, deu-se por concluído o exame, ordenado e de tudo se lavrou o presente auto que vai por mim escrito, assinado e rubricado pela autoridade, assinado pelos peritos e testemunhas, comigo Antônio Inocêncio de Oliveira, Escrivão, o assinei e assino.
Processo-crime contra Virgulino Ferreira e outros instaurado na Comarca de Martins/RN, 1927, fls. 13/15.

Apesar de todo empenho em buscar ajudar o amigo Egídio, o que o grupo não sabia era que a sua ação era inútil. Algum tempo antes, no bivaque armado pelos bandidos, em meio ao cansaço generalizado da tropa de Lampião, o sequestrado Egídio conseguiu fugir para o meio do mato.

MEMÓRIAS DE UMA NOITE DE TERROR

Seguramente Lucrécia é um dos locais onde a memória da jornada de Lampião pelo Rio Grande do Norte é mais trabalhada.

Especificamente em relação as propriedade Cacimba de Vaca e Castelo, apesar da comprovação da passagem do bando por estes locais, este fato não é muito comentado e nem tão lembrado como é nos sítios Serrota e Caboré.

Foto do açude Lucrécia vinte anos após a passagem do bando de Lampião pela região.

Segundo os membros da família Leite, que até hoje habitam a tradicional propriedade, a velha casa onde padeceram Egídio e Donatila é sempre visitada por pessoas que desejam conhecer mais da passagem do bando pela região.

Para a família Leite estas visitas ocorrem pelo fato da proximidade da sua região com a cidade turística de Martins. Os guias de turismo apontam a região próxima ao sítio Serrota como um interessante local para visitação. Além dos fatos históricos e a proximidade com Martins, existe outro fator para ocorrer esta situação, a preservada casa de Egídio está distante apenas 300 metros da RN-072 e a família Leite se desdobra em atenção para aqueles que desejam conhecer estes fatos.

A própria comunidade de Lucrécia ofertou a família uma placa onde o dístico é bastante claro sobre a maneira como as pessoas da região definem as figuras de Egídio e Donatila, “heróis”. Inclusive esta foi a palavra mais utilizada pelas pessoas da região ao comentarem sobre o caso. A família Leite apresenta esta placa com extremo orgulho.

Ainda em relação à Donatila Leite, busquei dialogar diretamente com a família, que não fez nenhuma restrição às dúvidas que tinha, em relação a uma informação delicada e negativa.

Donatila e Egídio na Serrota. Tranquilidade junto aos familiares.

Segundo várias pessoas que entrevistei nas cidades de Antônio Martins, Martins e Lucrécia, Donatila teria sido sumariamente violentada por vários membros do bando, inclusive o próprio Lampião.
Tida como uma mulher bonita na sua juventude, este pretenso estupro coletivo ocorreu devido à raiva do chefe cangaceiro diante da fuga do pai de Egídio, o fazendeiro Joaquim Dias da Cunha da sua propriedade Cacimba de Vaca. O ato abominável e covarde teria sido realizado diante do marido, que foi obrigado a ver as cenas terríveis.

Existem variadas versões que comprovariam o fato. A mais corrente informa que no outro dia após o ataque, Donatila teria subido a serra transportada em uma rede, seguido para a cidade de Martins para se tratar com o único médico existente na região. O seu estado era deplorável e a mesma ficou em situação delicada por um tempo superior a dez dias.

Para a família é tudo invencionice. Realmente Donatila subiu para Martins em uma rede, mas foi por fatores mais do que lógicos diante de tão terrível situação. Ela foi ficar junto do marido, que seguiu para esta cidade com o intuito de se recuperar da verdadeira “surra” de espinhos que levou ao fugir do bando na madrugada. Certamente que Egídio não poderia deixar de participar do sepultamento dos três amigos que morreram tentando salvar a sua vida, além de prestar esclarecimentos às autoridades. O fato de Donatila subir a serra de Martins em uma rede se devia ao seu abalado estado psicológico, sendo esta prática de transportar enfermos para o alto da serra, uma situação comum no passado.

Para mostrar quanto nada disto era verdade, a própria família Leite me deixou reproduzir a fotografia anterior, onde vemos Egídio e Donatila na década de 1940 ou 1950, em meio a muitos familiares, vivendo na mesma casa do sítio Serrota.

Mesmos para aqueles que afirmaram ter Donatila Leite sido sucessivamente sido violentada por vários cangaceiros, são unânimes em apontar que ela viveu tranquila, sem rancores em relação ao possível fato e era tida como uma ótima pessoa. Para a família esta é mais uma prova que nada relativo ao que se comenta realmente ocorreu. Para eles, se Donatila tivesse sofrido a terrível violência sexual que muitos afirmam, em uma época “onde tudo era atrasado e difícil”, ela não teria sido uma mulher que viveu de forma feliz e tranquila.

A LEMBRANÇA DOS TRÊS HERÓIS

Monumento da “Cruz dos três Heróis”.

Se Donatila Leite conseguiu viver, os três amigos de seu marido não tiveram a mesma sorte. Mas igualmente não foram esquecidos pela comunidade.
Ao realizar o trabalho de pesquisa na região, ficou patente que a morte de Bartolomeu Dias, Francisco Canela e Sebastião Trajano é um dos fatos mais conhecidos e mencionados por pessoas de diversas idades, relativas a passagem do bando de Lampião.

Autores afirmam que o grupo de homens que seguiu do Sítio Serrota, não desejavam o enfrentamento com os cangaceiros e nem resgatar Egídio Dias em um primeiro momento. A intenção deste grupo era o de autoproteção, para assim seguirem até a povoação de Gavião e de lá trazerem o valor do resgate do fazendeiro. Entretanto para todas as pessoas com quem dialoguei, estes são categóricos em afirmar que a intenção destes homens era “salvar Egídio”, ou assim foi como ficou preservada em suas memórias.

Placa alusiva ao episódio.

Das cidades de Antônio Martins a Felipe Guerra, em inúmeros locais, ouvi vários comentários elogiosos a valentia, a intenção destemida e magnânima destes homens em salvar um amigo. Isso tudo diante do bando do maior cangaceiro que o Brasil já viu. Um inimigo experiente, mais forte em número de armas e de combatentes. Para o povo da região, estes três homens são heróis.

As margens da rodovia estadual RN-072, na comunidade Caboré, se encontra um marco, conhecido como “A cruz dos três heróis”, aonde o povo de Lucrécia e da região vêm àqueles que agora são conhecidos apenas como “Os Canelas”, ou os “Heróis de Caboré”.

Apesar do empenho do povo de Lucrécia em manter viva a memória do sacrifício destes três homens, o local onde a cruz se encontra é perigoso para aqueles que desejam parar algum veículo, com a intenção de fotografar o monumento. Este fato ocorre devido à inexistência de um acostamento as margens da pista de asfalto, ou de uma área apropriada para estacionamentos. Outra dificuldade para o pretenso visitante é a falta de uma placa de sinalização posicionada antes do monumento, nos dois sentidos da estrada.

A inexistência desta indicação mostra para muitos motoristas que aquele monumento mais parece destinado a homenagear pessoas que morreram em algum acidente automobilístico e não em um combate contra o bando de Lampião.

Se o visitante não tiver cuidado, é provável que a próxima cruz na beira da estrada seja a dele.

UMA PEÇA DE TEATRO MARCA A MEMÓRIA LOCAL

O autor junto ao grupo de teatro “Tribo da Terra”.

Finalizando, encontramos neste município uma das poucas expressões teatrais que trata do tema ligado a passagem de Lampião e seu grupo, encontrada em todo o trajeto percorrido.
Atualmente o sítio Caboré é uma comunidade rural em expansão, neste local atua uma organização denominada Grupo Juventude Unida de Caboré, que surgiu há 17 anos com o intuito de mobilizar os jovens da localidade em torno de atividades sociais diversas. Uma destas atividades é voltada para a participação no desenvolvimento da cultura local, utilizando principalmente o teatro como ferramenta e meio de expressão. Em 2006, com o apoio da Fundação Laura Vicunha, sete integrantes do Grupo Juventude Unida de Caboré participaram de uma oficina teatral ministrada pela Universidade Católica de Brasília e deste aprendizado surgiu o grupo de teatro denominado “Tribo da Terra”.

Esta trupe foca sua atuação em diversas temáticas voltadas na própria realidade da comunidade, dentre estes os fatos que envolveram a sua história. Neste sentido, o grupo desenvolveu uma peça teatral denominada “Na boca do povo e das almas”, onde trata exclusivamente dos trágicos episódios vividos em junho de 1927. A peça é dividida em três atos, onde o público conhece a história da comunidade na época da passagem do bando, as ações dos cangaceiros e a reação da comunidade enaltecendo a ação dos “Heróis de Caboré”.
Não tivemos a oportunidade de assistir esta peça, mas foi possível em um momento de diálogo com este grupo de teatro, liderados pela estudante de pedagogia Adriane Maia Dias conhecer mais desta iniciativa interessante. Os ensaios do grupo ocorrem na ADCRC – Associação de Desenvolvimento Comunitário de Caboré.

sábado, 13 de fevereiro de 2016

David Uip: “Só se fala do vírus zika, mas o chikungunya é uma encrenca"

O secretário estadual de saúde de São Paulo fala a ÉPOCA sobre os danos do vírus que provoca dores articulares prolongadas e até perda auditiva
O secretário estadual de Saúde de São Paulo, David Uip (Foto: Rogério Gomes / BrazilPhoto Press / Ag. O Globo)
ÉPOCA – A população está apavorada com o zika, mas parece minimizar os danos provocados por outros vírus transmitidos pelo mosquito Aedes aegypti. É um erro?
David Uip – Ninguém fala do chikungunya. Isso é uma encrenca do tamanho do mundo. Estou vendo gente com sintomas há mais de seis meses. As pessoas só estão preocupadas com o zika. Temos 133 casos registrados. Muitos com complicações importantes. Perda auditiva em adulto, dores articulares. Atendi um paciente no consultório com sorologia positiva para dengue, chikungunya e exame genético para zika vírus. Mas o quadro clínico dele é de chikungunya.
ÉPOCA – Como assim? Ele pegou os três vírus?
Uip –  Não. Acho que ele só tem chikungunya. Quando fazemos os exames para as outras arboviroses, eles dão falso positivo. Só que tudo isso é novo. É um aprendizado para todo mundo. Esse paciente é paulista e trabalha no interior de Pernambuco. Teve perda auditiva comprovada. São casos complicados.
ÉPOCA – O zika vírus vai se espalhar como o da dengue?
Uip – Se é verdade que o zika é um sorotipo só, em tese ele será menos endêmico que o vírus da dengue. Mas isso só o tempo vai dizer. O anticorpo anti-zika vírus confere imunidade definitiva? Ou não? Ninguém sabe ainda se uma pessoa que pegou zika pode se infectar novamente. 
ÉPOCA – O Brasil está perdendo a guerra contra o mosquito?
Uip – É um momento muito difícil. Precisamos de providências excepcionais. Há 113 países com dengue. Não dá para achar que é um problema regional. Esse é um problema mundial.
ÉPOCA – O que deixou de ser feito?
Uip – Muitas coisas. Para o Brasil chegar ao nível adequado de cuidados sanitários vai demorar 50 anos. Não se investiu. A população é desassistida. Faltam cuidados, investimento em pesquisa, inovação e tecnologia. São coisas que não aconteceram nos últimos 50 anos e agora nós estamos pagando a conta.
ÉPOCA – Recentemente, o professor José Guedes, ex-secretário estadual de saúde, disse que a coisa mais constante feita no Brasil para o combate à dengue foi a inconstância. Qual é o exemplo principal dessa inconstância?
Uip – O financiamento é inconstante. Não tenho a menor dúvida. Precisamos de qualidade de informação e constância. Esse é o desafio. Não adianta ter no estado de São Paulo se o entorno não tiver. Não adianta ter no Brasil se os países vizinhos não tiverem. Precisamos de uma ação global. Desta vez, a Organização Mundial da Saúde (OMS) está se importando no tempo adequado. Não foi assim no passado. Agora todo mundo está dando a devida seriedade para isso.
ÉPOCA – Faltam recursos do governo federal?
Uip – O ministro Marcelo Castro foi claro ao dizer que não faltarão recursos. Recurso é fundamental, mas saber usá-lo é tão importante quanto. Não podemos sair fazendo coisas que não vão surtir nenhum efeito. Tem desafios que são insuportáveis.
ÉPOCA – O Ministério da Saúde estabeleceu como meta visitar 100% das casas até fevereiro para o combate à dengue. O que o sr. acha disso?
Uip – É um desafio enorme. Estamos tentando. Estamos seguindo toda a política ministerial.
ÉPOCA – É factível?
Uip – Acho que não é simples. Fizemos uma experiência boa num final de semana. Visitamos 450 mil residências, mas para isso nós colocamos a Defesa Civil, Exército, Polícia Militar, Igrejas, escoteiros. Autoridade pública, nós sozinhos, nem pensar. A Defesa Civil entrando é interessante. A Defesa Civil faz parte da sociedade e é muito bem vista. Estamos aumentando muito os agentes comunitários. Vamos começar a pagar hora extra aos sábados para agentes comunitários. Estamos fazendo o possível para atender essa necessidade. Mas é um enorme desafio.
ÉPOCA – No ano passado, o estado de São Paulo viveu uma epidemia recorde. Qual é a autocrítica que o sr. faz?
Uip – O Estado fez o melhor possível dentro daquilo que ele estava acostumado a fazer. E ficou claro que foi insuficiente. São Paulo foi poupado das grandes epidemias nacionais. De repente, o mosquito chegou ao estado e atingiu uma população que não esteve exposta antes. É tudo o que o vírus da dengue quer. O que aconteceu? Principalmente os municípios com menos de 10 mil habitantes sofreram muito. Isso gera, praticamente, um esgotamento da população suscetível nessas cidades. Nos municípios grandes foi diferente. Em 2014, houve uma epidemia em Campinas. Quando olhamos o mapa, dá para ver que atingiu metade dos bairros. Repicou em 2015 na outra metade. Outro dado interessante: em janeiro de 2015, tivemos 57 mil casos notificados. Em janeiro de 2016, tivemos 9 mil casos.
ÉPOCA – O que isso significa?
Uip – Olhando com cuidado é uma boa notícia, mas há outra coisa que nos preocupa. O sorotipo 1 do vírus da dengue é o que prevalece em São Paulo. Ele responde por 99% dos casos da doença. Mas o sorotipo 2 está entrando no estado. A população resistente ao sorotipo 1 é suscetível aos demais sorotipos: o 2, o 3 e o 4. Cada vez que uma pessoa tem dengue, o percentual de gravidade cresce. Aumenta o risco de dengue hemorrágica. A resposta do organismo já ocorreu na primeira infecção. A memória imunológica pode causar uma hipereação.
ÉPOCA – E agora? Como o estado vai se portar diante disso?
Uip – Estamos tomando atitudes excepcionais para enfrentar o mosquito. Exército, Polícia Militar, convocação dos estudantes universitários, escoteiros. Uma mobilização da sociedade inteira. 
ÉPOCA – O combate à dengue é uma atribuição dos municípios. O Estado vai destinar verbas para que as cidades consigam cumprir as metas de combate ao mosquito?

Uip – Vamos pagar as diárias dos sábados dos agentes comunitários dos municípios que aderirem ao programa. É um recurso enorme. Estamos estimando em mais de R$ 50 milhões só nisso

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

E agora: Pesquisadores comprovam que o maior cajueiro do mundo é do Piauí

Sequenciamento genético e medições geográficas comprovam o título.

Cajueiro do Piauí é 300 m² mais extenso que o do Rio Grande do Norte.ACEBOOK

Turistas visitam cajueiro do Piauí (Foto: Gilcilene Araújo/G1)Turistas visitam cajueiro do Piauí (Foto: Gilcilene Araújo/G1)
Pesquisadores da Universidade Estadual do Piauí (Uespi) e da Universidade Federal do Piauí (UFPI) comprovaram esta semana que o cajueiro do Piauí, mais conhecido como'Cajueiro Rei', é o maior do mundo. Diferente do que se tem registrado no Guinness Book, que dá o título para o cajueiro do município de Parnamirim, no estado do Rio Grande do Norte.

Desde julho do ano passado, uma equipe de especialistas tem se debruçado sobre os dois cajueiros para comprovar que de fato, o Cajueiro da Praia é o maior.
Cajueiro no Piauí quer o título de o maior do mundo (Foto: Reprodução/TV Clube)Cajueiro no Piauí quer o título de o maior do mundo
(Foto: Reprodução/TV Clube)
Para isso, uma equipe do laboratório de biologia molecular e de estudos de injúrias biológicas (LABMIMBIO) da Uespi, que chefia a equipe que investiga o caso, identificou através de um sequenciamento genético que os dois cajueiros são da mesma espécie.

Além disso, duas medições geográficas comprovaram que a extensão do cajueiro do Piauí é de 8.800 m² contra 8.500 m² do Rio Grande do Norte. Um total de 300 m² de diferença.

O secretário de Turismo do Piauí, Flávio Nogueira Júnior, contou que a pesquisa foi solicitada já com a certeza de que o cajueiro do Piauí seria o maior do mundo. O trabalho de pesquisa, segundo ele, foi apenas para se ter uma amostra mais fidedigna sobre a extensão do 'Cajueiro Rei'.

Como comprovada, o próximo passo, segundo o secretário, será contatar o Guinness Book para que o título que foi dado ao cajueiro do Rio Grande do Norte seja revisto.

"Nós temos que tratar esse título com carinho, até porque isso vai trazer muitos benefícios tanto para o setor turístico quanto para a economia do estado. A ideia é colocar para frente projetos para fazer de lá um grande centro de lazer e turismo", disse.