quarta-feira, 28 de setembro de 2016

Churrasco, queijo nobre e até ‘jegueterapia’: Nordeste tenta resolver problema dos jumentos soltos nas estradas

Dois anos após um promotor do Rio Grande do Norte ter feito um churrasco de jumento para incentivar o uso do animal como alimento, o Nordeste ainda tenta resolver o problema de jegues abandonados pelas estradas.
Jumento solto em estrada no RN, ação de recolhimento no Piauí e animais a serem abatidos na Bahia
Doações, abate legal, produção de queijo nobre, transporte de bananas, atração turística e até "jegueterapia": não faltam alternativas, mas nenhuma emplacou até agora.
O lombo do jumento perdeu espaço no Nordeste para motos e máquinas agrícolas. A frota de duas rodas no Brasil cresceu quase 600% desde 2003: 1,2 milhão para 6,9 milhões de veículos.
Sem utilidade, o bicho foi sendo abandonado. Passou a circular solto em estradas, agravando o problema dos acidentes na região, que concentra 90% dos asininos (que incluem ainda burros e mulas) do Brasil.
Não há estatísticas precisas sobre acidentes com jumentos no Nordeste. Os dados são organizados como "acidentes com animais", mas a Polícia Rodoviária Federal (PRF) assegura que a maioria envolve asininos.


Ação de recolhimento de jumento em estrada no PiauíImage copyrightDIVULGAÇÃO/PRF
Image captionSímbolo da região, jumento foi sendo abandonado no Nordeste e passou a circular solto em rodovias

Somente nas estradas federais que cortam a região houve 8.050 acidentes com animais de 2012 a agosto deste ano, com 1.647 feridos graves e 259 mortes. E desde 2015 foram mais de 27 mil apreensões de animais.

Convênios com prefeituras

Diante da situação, a PRF em alguns Estados busca soluções para ao menos diminuir o número de asnos nas rodovias.
No Maranhão, por exemplo, a polícia e a Aged (Agência Estadual de Defesa Agropecuária) celebraram um convênio no ano passado para que o governo abrigasse animais apreendidos.
De lá para cá, porém, a agência ainda não disponibilizou espaços para receber os bichos.
"Ficamos, assim, 'espremidos' entre dois crimes: a prevaricação, por não retirar os animais das rodovias, e maus tratos aos animais, por não ter condição de abrigá-los de forma apropriada", informou, em nota, a PRF no Maranhão.
A agência diz que o convênio não andou por falta de dinheiro e parceiros, e porque falta aprovar uma lei que permita "a expropriação e doação dos animais a terceiros".
"Não dispomos de recursos financeiros para custear exames necessários e obrigatórios à manutenção desses animais em qualquer propriedade ou mesmo à doação", informou.

Recorrendo a Jesus

Convênios com prefeituras também não deram certo no Rio Grande do Norte. Mas lá jumentos encontram abrigo na fazenda de Jesus, apelido do agricultor Eribaldo Nobre, 52 anos.
Numa fazenda de 500 hectares em Apodi, na divisa com o Ceará, Jesus planta melancia, milho e sorgo e há três anos recebe animais abandonados - a fazenda é sede de uma associação de proteção animal.
Ele cuida de cerca de 400 jumentos, sendo 150 fêmeas, e de mais de cem cachorros e gatos. O local chegou a abrigar 1,2 mil jumentos, mas reduziu o acolhimento por causa da seca que atingiu a região e matou centenas de animais.


Criação de jumentas para ordenha do leite em Carpina (PE)Image copyrightDIVULGAÇÃO
Image captionÁrea de criação de jumentos em Carpina (PE) para produção de leite; investidores estrangeiros visam produto para produção de queijo nobre

"Perdi mais de 700 fêmeas ano passado", disse Jesus, hoje animado com o recente anúncio da instalação, na cidade vizinha de Felipe Guerra , de uma empresa para beneficiamento do leite de jumenta.
O objetivo do negócio é produzir queijo pule, uma iguaria com mercado cativo na Europa e na Ásia, onde o quilo do queijo chega a valer R$ 3.000.
"Estou planejando comprar maquinário para fazer a ordenha e vender meu leite. Mas o que vou fazer com tantos machos, que sustento sozinho?", questiona ele, para quem os machos deveriam ser abatidos - sem sofrimento - para aproveitar carne e couro.

Bacias leiteiras

Quem toca o projeto do queijo pule - o que anima Jesus - são investidores chineses e ingleses.
A empresa Green Building quer criar uma bacia leiteira na região de Felipe Guerra para fornecimento do insumo. "Queremos mudar o pensamento do nordestino, mostrando a eles o valor dos asininos", declarou a firma em nota.
A empresa diz que irá incentivar a criação dos animais e organizar pontos de coleta do leite, com câmaras de resfriamento.
O governo promete apoiar. "Vamos buscar linhas de financiamento e queremos aproveitar fazendas que tiveram problemas de seca nos últimos cinco anos. Muitas estão vazias, e vamos colocar jumentos soltos nas estradas nelas", disse o secretário de Agricultura, Guilherme Saldanha.
Segundo um estudo de 2015 de pesquisadores da Universidade Federal e do Instituto Federal do Rio Grande do Norte, o leite de jumenta é alimento seguro, similar ao leite humano e com menor teor de gordura.

Churrasco de jumento

Outra possibilidade ligada ao consumo envolve a própria carne do animal.
A solução ganhou fama em 2014, quando o promotor Silvio Brito, que atuava em Apodi (RN), organizou um churrasco com carne do animal para sensibilizar autoridades e imprensa para a alternativa.
A ideia revoltou alguns defensores dos animais, que chegaram a ameaçar o promotor nas redes sociais.


Churrasco de carne de jumento organizado em 2014 por promotor no Rio Grande do NorteImage copyrightMARCELINO NETO/O CÂMERA
Image captionChurrasco de jumento organizado em março de 2014 pelo promotor Silvio Brito (no alto à dir., de terno); tentativa de mostrar potencial como alimento gerou reação de ambientalistas

Houve também resistência na cidade - o prefeito teve que ir a uma rádio negar que a carne de jumento fosse ser incluída na merenda escolar.
"O jumento pode fornecer até 100 kg de carne de primeira qualidade, uma peça de couro de alto valor (cerca de R$ 120 a peça) e um leite que pode salvar a vida de milhões de pessoas que sofrem com intolerância à lactose ou deficiência nutricional", diz Brito.
Diretora da ONG Bicho Feliz, que atua no Nordeste, Gislaine Brandão critica o uso de jumentos para consumo da carne, couro ou leite.
"É um animal que vem sofrendo há décadas. Eles devem ser aposentados, livres, sem trabalho. O Estado brasileiro deveria cuidar melhor desses animais", afirma.

Abate controlado

Alegando alto risco de acidentes nas estradas com jumentos, o governo da Bahia anunciou que pretendia abater 2.000 desses animais até outubro deste ano. A carne seria usada para fabricação de ração animal, a ser doada ao zoológico de Salvador.
O Ministério Público, contudo, não viu a solução como "adequada e ética" e recomendou a paralisação dos abates, interrompidos em julho.
A Promotoria diz que 978 animais chegaram a ser abatidos em um frigorífico no interior do Estado que não tinha licença para essa atividade - o local acabou multado em R$ 50 mil pelo órgão ambiental estadual.


Jumentos reunidos pára abate na BahiaImage copyrightDIVULGAÇÃO/AGORA NA BAHIA
Image captionJumentos reunidos para abate em frigorífico em Miguel Calmon (BA); atividade autorizada pelo Estado foi suspensa a pedido do Ministério Público

A Secretaria de Agricultura do Estado diz que o frigorífico tinha licença quando recebeu autorização para abate e que atua "sem omissão e negligência diante das mortes dos jumentos nas estradas ou nos abates clandestinos".

Outras alternativas

Um estudo de 2014 da comissão de meio ambiente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) em Mossoró (RN) concluiu que o consumo da carne de jumento "não tem amparo cultural, comercial e econômico".
Como alternativa para conter o número de animais abandonados, cita a introdução dos bichos em parques ecológicos, em projetos turísticos, reintrodução em atividades rurais e até "jegueterapia", em tratamentos para pessoas com problemas locomotores e psicológicos.
"O jumento, por ser muito dócil e de porte pequeno em relação ao cavalo, vem sendo utilizado em muitas clínicas com resultados positivos", diz a comissão em relatório.
Para uma associação que trabalha com jumentos da raça "pêga", mais presente em Minas Gerais e São Paulo (mas com 6,2 mil animais registrados no Nordeste), o custo de criação do jumento é "muito alto para destinar ao consumo humano de sua carne, pele e leite".
Para que a produção do leite se tornasse viável economicamente, diz a associação, seria preciso investir em melhoramento genético, para aumentar o volume produzido.


Homem em jumento na praia de Genipabu, no Rio Grande do NorteImage copyrightBUDA MENDES/GETTY IMAGES
Image captionUso de jumento na praia de Genipabu, no Rio Grande do Norte; OAB local sugere emprego do animal em projetos turísticos

"Devido à pouca quantidade de leite produzido pela jumenta, o mesmo é destinado apenas às crias. Contudo, os animais que não tem mais utilidade e representam um problema social poderiam ter essa destinação (abate)."
Numa região na fronteira do Rio Grande do Norte com o Ceará, três empresas agrícolas exportadoras de banana usam há quatro anos o jumento como animal de tração.
Em cada empresa, de 25 a 35 animais ajudam no transporte dos cachos da área de produção até a casa de embalagem, por meio de um sistema chamado "cabo-via", em que frutas são enfileiradas no ar, dependuradas em um fio e puxadas pelo animal com a ajuda de um carrinho.
Muito usado na América Central, o sistema é uma exigência de importadores, para que a fruta não tenha contato com o chão.
Numa dessas empresas, a Agrícola Famosa, de Russas (CE), os animais transportam de 30 a 40 cachos por viagem - são seis viagens por dia.
O técnico agrícola da fazenda, Odirley Fernandes, disse que só não tem mais animais por causa da seca, que tem prejudicado a plantação. "Há dois anos eram 400 hectares de banana, hoje temos pouco mais de 200 hectares."
Enquanto nenhuma alternativa decola de vez, o promotor que com um churrasco trouxe o assunto para a vitrine nacional lamenta a situação.
"Acredito firmemente no potencial econômico do jumento. Causa-me frustração o fato de as demais pessoas não verem isso. Todos os estudos e nossa experiência apontam que o jumento é um animal de qualidades extraordinárias", afirma.

domingo, 25 de setembro de 2016

País vai às urnas com milhares de candidaturas indeferidas

O primeiro turno das eleições municipais, no próximo domingo, terá a participação de milhares de candidatos cujos registros foram negados ou cancelados pela Justiça Eleitoral, mas seguem na disputa apoiados em recursos ainda não analisados. Até o momento, 13.856 postulantes a prefeito, vice-prefeito e vereador estão nessa situação. Eles até poderão receber votos para vencer, mas não é certo que exercerão os mandatos para os quais foram eleitos.
Em todos os casos, os candidatos foram rejeitados por alguma irregularidade que, em tese, os impediria de concorrer. Juízes eleitorais de primeira instância invalidaram os registros de candidatura, mas eles aguardam que seus recursos sejam julgados nos tribunais regionais eleitorais (TREs) e no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Sem uma decisão definitiva, todos aparecerão com a votação zerada no sistema de apuração na noite de 2 de outubro. No entanto, saberão os votos que receberam porque o número é divulgado em paralelo.
Essa situação já ocorria em pleitos anteriores, mas ficou mais crítica com a reforma eleitoral que diminuiu o tempo de campanha de 90 para 45 dias. Com isso, encurtou-se também o tempo para o julgamento definitivo. Até agora, só 91 recursos estão no TSE, sendo que outros 13 mil ainda podem chegar à Corte. Na eleição passada, no mesmo período, mais de cinco mil recursos desse tipo já tinham chegado ao TSE, última instância da Justiça Eleitoral. Essa diferença se dá justamente porque, em 2012, nessa mesma época, os juízes eleitorais e os TREs tiveram mais 45 dias para julgar os casos.
— Agora que estamos começando a receber os recursos sobre os registros de candidatura no TSE. Vai ser difícil até a diplomação (dos candidatos) ter tudo isso resolvido — afirmou o presidente do TSE, ministro Gilmar Mendes. Com informações de O Globo.

terça-feira, 13 de setembro de 2016

Bode vai “disputar” prefeitura com única candidata em município do Ceará

Batizado de “Bode 90”, o animal já desfilou pelas ruas da cidade e ganhou a simpatia da população

Com apenas uma opção de candidatura à prefeitura em 2016, moradores do municípios de Jati, a 524,8 quilômetros de Fortaleza, encontraram uma forma inusitada de “reverter” a situação. Um caprino, batizado como “Bode 90”, é o mais novo opositor à reeleição da atual prefeita Maria de Jesus Diniz Nogueira (PSD), conhecida como Neta, e está fazendo sucesso na cidade.
A oposição à atual gestão preparou a candidatura do médico Dr. Jarbas, que teve o registro rejeitado porque não se descompatibilizou de sua função no programa Mais Médicos, do Governo Federal. “Fizemos reuniões, tentamos trabalhar outros nomes, mas tomamos a decisão mais coerente de não termos candidato”, afirma o membro da oposição e professor universitário Kael Rocha. A ideia de lançar o bode – pontua Rocha, não partiu da oposição.Como a reeleição de Neta não é unanimidade, parte da população decidiu iniciar uma campanha em protesto. “Um grupo de jovens resolveu criar a questão do voto de protesto, uma coisa engraçada, porém com muito respeito ao pleito eleitoral”, afirma Kael.
O sobrenome 90 é uma referência ao número do animal no jogo do bicho e é parte da campanha pelo voto nulo. “Quando você bota 90 (na urna) você anula o seu voto porque, aqui, em Jati, não tem partido com a legenda 90 registrada”, ressalta.
O bode já ganhou comitê, adesivo, cartaz, desfile, carreata e a simpatia dos moradores de Jati. Rocha conta que o Bode 90 tem sido solicitado para participar de atos de campanha em diversas comunidades. Por isso, a próxima meta é comprar um bode de plástico para não maltratar o animal.
“Vamos procurar um bode de fibra para não desgastar tanto o bode (verdadeiro), para que ele não estresse”, ressalta Rocha.

sábado, 10 de setembro de 2016

Brasil é um dos dez piores em rendimento escolar, aponta ranking internacional



Estudo apresentado pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) revela que Brasil, Peru, Colômbia e Argentina lideram em notas baixas na escola. Mesmo com resultado ruim país teve melhora em matemática

O Brasil é um dos dez países com mais alunos com baixo rendimento escolar em matemática, leitura e ciência, segundo relatório divulgado nesta quarta-feira pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), em Paris, que avaliou a situação de 64 nações. De acordo com o levantamento, 1,1 milhão de estudantes brasileiros com 15 anos não têm capacidades elementares para compreender o que leem nem conhecimentos essenciais de matemática e ciências. Ao mesmo tempo, o relatório revela que o Brasil é um dos países que mais reduziram o número de alunos sem conhecimentos básicos de matemática.

“Acredite: você não odeia matemática”

O relatório, intitulado Alunos de baixo desempenho: por que ficam para trás e como ajudá-los?, baseia-se em dados de 2012 do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA), da OCDE. A Indonésia apresentou os piores resultados, com 1,7 milhão de estudantes com baixo desempenho. Ao lado do Brasil, Peru, Colômbia e Argentina são alguns dos países com pior rendimento escolar nas três disciplinas.

Dos 2,7 milhões de alunos de 15 anos avaliados no Brasil, 1,9 milhão tinham dificuldades em matemática básica, 1,4 milhão em leitura e 1,5 milhão em ciências. Cruzados, os números indicam que 1.165.231 estudantes tinham dificuldades em cumprir tarefas básicas nas três áreas de conhecimento.

Outra constatação do estudo é de que o Brasil está no “top 10” de países mais desiguais do mundo no que diz respeito à diferença de desempenho entre estudantes de classes sociais altas e baixas.

Matemática – O Brasil, diz a organização, é um dos nove países que mais reduziram o número de estudantes com problemas em matemática básica no período entre 2003 e 2012. A redução foi de 18%. México, Tunísia, Turquia, Alemanha, Itália, Polônia, Portugal e Rússia também apresentaram resultados semelhantes.

Na área matemática, 67,1% dos alunos brasileiros estão abaixo do nível 2 (os níveis são de 1 a 6). Os últimos patamares são alcançados apenas por 0,8% dos estudantes brasileiros. No ranking, o país fica em 58º lugar, somando 391 pontos na escala do PISA, contra uma média de 494 pontos obtidos por estudantes que vivem em países-membros da OCDE, entidade composta por 34 nações.

Parte dos resultados ainda muito negativos do Brasil se deve à maior inclusão de estudantes no sistema educacional ao longo dos últimos 15 anos, de acordo com Alfonso Echazarra, analista da Direção de Educação da OCDE. Entre 2003 e 2012, o índice de escolarização passou de 65% para 78%.

Como a inclusão se dá incorporando alunos que estão na base da pirâmide social, em classes mais desfavorecidas, seus primeiros anos de educação são mais problemáticos, pois eles costumam frequentar escolas com menos recursos, como as de regiões rurais. Nesse cenário, a redução do número de estudantes com problemas em matemática, leitura e ciências é um sinal positivo que pode ser comemorado.

“O Brasil é um claro exemplo de que o investimento em educação leva a melhores resultados, o que nem sempre é o caso em outros países”, explica Echazarra.

Recomendações – Em termos mundiais, entre os 12,9 milhões de alunos com desempenho baixo, 11,5 milhões têm problemas em matemática, 8,5 milhões leem com dificuldades e 9 milhões têm lacunas no aprendizado de ciências.

Para romper o ciclo de baixo nível educacional, a OCDE recomenda que os governos identifiquem os estudantes com baixa performance e lhes ofereçam estratégias para a recuperação.

Entre as propostas da entidade, a maior parte tem caráter estrutural: reduzir a desigualdade no acesso à educação, estimular a inscrição escolar o mais cedo possível, envolver os pais na comunidade escolar e fornecer programas de auxílio financeiro às instituições de ensino e às famílias carentes.