quarta-feira, 9 de março de 2016

Chikungunya: o vírus que envergou uma cidade


O drama de Valente, o município mais afetado pela doença no Brasil em 2015

CRISTIANE SEGATTO
09/03/2016 - 16h03 - Atualizado 09/03/2016 16h23Valente é uma cidade baiana de 30 mil habitantes. Fica na região de Feira de Santana e vive, principalmente, da produção de sisal. A atividade que exige disposição e braços fortes foi gravemente afetada pelo vírus chikungunya desde o segundo semestre de 2014. Não só ela. O vírus deixou um rastro de perdas. Roubou a saúde da população, fez um estrago nas contas da prefeitura e prejudicou a economia local.
Grande parte dos trabalhadores caiu de cama. Esse é um vírus que parece ter predileção pela população em idade produtiva. Muitos infectados continuam sentindo dores nas articulações até hoje. Gente jovem, independente, passou a precisar de ajuda até para vestir a roupa. Continua a consumir antiinflamatórios, a precisar de fisioterapia e a exigir constantes afastamentos do trabalho.
Por que devemos olhar para Valente? Porque a cidade é um microcosmo do que o Brasil pode se tornar, caso continue a subestimar o custo social desse vírus. “Só se fala do zika, mas o chikungunya é uma encrenca”, disse o secretário estadual de saúde de São Paulo, David Uip, em entrevista a ÉPOCA no início de fevereiro.
No ano passado, Valente foi o município brasileiro com a maior incidência do vírus. Uma em cada onze pessoas foi infectada. Era difícil encontrar uma família sem nenhum caso da doença. “O chikungunya deu muito mais prejuízo à cidade que a dengue”, diz o secretário municipal de saúde Agnaldo de Oliveira Silva. “Foi uma coisa assustadora”.
Sem conseguir caminhar, com fortes dores e postura curvada, as pessoas faltavam ao trabalho e faziam fila no único hospital municipal. A demanda por atendimento mais que dobrou. De 2,5 mil atendimentos médicos por mês, a cidade passou a realizar 4 mil. O gasto com medicamentos dobrou.
A prefeitura foi obrigada a destinar 28% do orçamento à saúde(muito mais que os 15% determinados por lei). Todas as outras áreas foram sacrificadas. Faltou dinheiro para as obras de infraestrutura e manutenção. “Além do custo altíssimo para a gestão pública, existe o custo de previdência”, afirma Agnaldo. “Mais de um ano depois da infecção, há pessoas que ainda não conseguiram voltar às atividades normais”.
No Brasil, 13 estados e o Distrito Federal têm transmissão local do vírus chikungunya. A experiência de outros países dá boas pistas do que nos aguarda. Em 2004, o vírus infectou 60% dos habitantes das Ilhas Reunião, no Oceano Índico. A doença deixou a população debilitada por muito tempo e afetou gravemente a economia. As pessoas não conseguiam sair de casa para trabalhar, estudar ou consumir.
Nos países do Caribe, já acostumados às agressões do vírus, os moradores costumam dizer que o chikungunya “não mata, mas aleija”. Os especialistas ressaltam que a cada epidemia, a doença parece se tornar ainda mais severa. Saiba mais no áudio de 2 minutos.

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