Ewerthon Tobace
Enquanto no Brasil escolas que "obrigam" alunos a
ajudar na limpeza das salas são denunciadas por pais e levantam debate sobre
abuso, no Japão, atividades como varrer e passar pano no chão, lavar o banheiro
e servir a merenda fazem parte da rotina escolar dos estudantes do ensino
fundamental ao médio.
"Na
escola, o aluno não estuda apenas as matérias, mas aprende também a cuidar do
que é público e a ser um cidadão mais consciente", explica o professor Toshinori
Saito. "Ninguém reclama porque sempre foi assim."
Nas
escolas japonesas também não existem refeitórios. Os estudantes comem na própria
sala de aula e são eles mesmos que organizam tudo e servem os colegas.
Depois
da merenda, é hora de limpar a escola. Os alunos são divididos em grupos, e cada
um é responsável por lavar o que foi usado na refeição e pela limpeza da sala de
aula, dos corredores, das escadas e dos banheiros num sistema de rodízio
coordenado pelos professores.
Marcelo Hide
"Também
ajudei a cuidar da escola, assim como meus pais e avós, e nos sentimos felizes
ao receber a tarefa, porque estamos ganhando uma responsabilidade", diz
Saito.
Michie
Afuso, presidente da ABC Japan, organização sem fins lucrativos que ajuda na
integração de estrangeiros e japoneses, diz ainda que a obrigação faz com que as
crianças entendam a importância de se limpar o que sujou.
Um
reflexo disso pôde ser visto durante a Copa do Mundo no Brasil, quando a torcida
japonesa chamou atenção por limpar as arquibancadas durante os jogos e também
nas ruas das cidades japonesas, que são conhecidas mundialmente por sua limpeza
quase sempre impecável.
"Isso
mostra o nível de organização do povo japonês, que aprende desde pequeno a
cuidar de um patrimônio público que será útil para as próximas gerações",
opina.
Estrangeiros
Para
que os estrangeiros e seus filhos entendam como funcionam as tradições na escola
japonesa, muitas prefeituras contratam auxiliares bilíngues. A brasileira Emilia
Mie Tamada, de 57 anos, trabalha na província de Nara há 15 e atua como
voluntária há mais de 20.
"Neste
período, não me lembro de nenhum pai que tenha questionado a participação do
filho na limpeza da escola", conta ela.
Michie
Afuso diz que, aos olhos de quem não é do país, o sistema educacional japonês
pode parecer rígido, "mas educação é um assunto levado muito à sério pelos
japoneses", defende.
Recentemente
no Brasil, um vídeo no qual uma estudante agride a diretora da escola por ela
ter lhe confiscado o telefone celular se tornou viral na internet e abriu uma
série de discussões sobre violência na escola.
Outros
casos de agressão contra professores foram destaques de jornais pelo Brasil nos
últimos meses, como da diretora que foi alvo de socos e golpes de caneta em
Sergipe e da professora do Rio Grande do Sul que foi espancada por uma aluna e
seus familiares durante uma festa junina.
No
Japão, este tipo de abuso dentro da escola é raro. "Desde os tempos antigos,
escola e professores são respeitados. Os alunos aprendem a cultivar o sentimento
de amor e agradecimento à escola", diz Emilia.
Violência
No
ano passado, durante as eleições, a BBC Brasil publicou uma série de reportagens
sobre a violência de alunos contra professores no Brasil. As matérias revelaram
casos de professores que chegaram a tentar suicídio após agressões consecutivas
e apontaram algumas das soluções encontradas por colégios públicos para conter a
violência – da militarização à disseminação de uma cultura de paz entre escolas
e comunidade.
Segundo
a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que ouviu
mais de 100 mil professores e diretores de escola em 34 países, o Brasil ocupa o
topo de um ranking de violência em escolas – 12,5% dos professores ouvidos
disseram ser vítimas de agressões verbais ou intimidação pelo menos uma vez por
semana.
"Assim
como o Brasil tem um programa de intercâmbio com a polícia japonesa, poderíamos
ter um na área educacional", propõe Michie, da ABC Japan, ao se referir ao
sistema de policiamento comunitário do Japão que foi implantado em algumas
cidades do Brasil.
A
brasileira lembra que a celebração dos 120 anos de relações diplomáticas entre
Brasil e Japão seria uma ótima oportunidade para incrementar o intercâmbio na
área social e não apenas na comercial.
"Dessa
forma, os professores poderiam levar algumas ideias do sistema de ensino japonês
para melhorar as escolas no Brasil", sugere Michie.
Arquivo pessoal
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